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Artigo: PL 03/2024 altera a legislação falimentar

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Aline Barini, Breno Pinto, Luiz Alexandre e Rodrigo D'Orio

 

O processo jurisdicional pode ser pensado como um campo de intervenção estatal para a solução dos conflitos. Se de um lado há o direito do jurisdicionado invocar o poder estatal diante de um conflito instituído, por outro, o Estado invoca para si a exclusividade de resolução a partir de normas pré-estabelecidas.

Neste ponto, o processo, ainda que de direito das partes, pertence ao Estado. Este assegura que seu modo constitucional de ser será garantido em um locus chamado processo. E é função — ou melhor poder-dever — do Estado a resolução dos conflitos por meio do exercício do poder jurisdicional nesse locus.

Muitos valores poderiam ser citados como base desse exercício, mas toma-se o da imparcialidade. Como destaca renomada doutrina, a imparcialidade,além de valor materializado pelo princípio do juiz natural, seria pressuposto da existência até mesmo da própria jurisdição.

Nessa lógica, o sistema jurisdicional como um todo é atravessado pelo valor da imparcialidade. Valor que implica na definição não apenas de quem presidirá o processo — como os magistrados, na maioria deles —, ou ainda dos demais auxiliares do juízo.

Microssistema falencial brasileiro

Se for pensando o microssistema falencial brasileiro, há ainda maiores justificativas para a intervenção estatal, por meio de um processo imbuído na imparcialidade, uma vez que o próprio legislador, ao prever a execução coletiva, tolhe direitos de credores individuais ao impedir o prosseguimento das execuções autônomas, impondo um regramento de partilha coletiva nos termos da LFR — como, por exemplo, a ordem de pagamento prevista nos artigos 83 e 84.

Nesse cenário, até mesmo aquele credor proativo, bem estruturado, possuindo o maior crédito, e que monitora a situação financeira desse devedor — e de certa forma se antecipa, na busca de seu direito inadimplido, propondo o processo de execução autônoma — não conseguirá satisfazer seu direito, devendo se sujeitar ao processo de falência.

O interesse desse credor mais “célere” não pode se sobrepor ao interesse dos demais credores, muito menos à finalidade do próprio processo.

Logo, ainda que haja direitos dos credores, o processo não é deles — muito menos do maior credor. O processo pertence ao Estado, e seu modo de ser decorre das aspirações do próprio Estado.

E como bem apontado pela doutrina, o microssistema falencial esboça escolhas de política pública na forma de resolução do conflito coletivo, ante o reflexo mercadológico e social.

Maior eficiência

Nesse ponto, o PL 03 de 2024, com a louvável intenção de apresentar alterações legislativas para uma maior eficiência do processo falimentar, propõe, dentre outros elementos, a figura de um gestor fiduciário.

Em brevíssima síntese, o gestor fiduciário substituiria o Administrador Judicial no processo falimentar.

Na prática, dentro do referido processo, caberia ao gestor executar diversos atos que hoje, de uma maneira geral, cabem ao Administrador Judicial — ou caberia, se o projeto apenas previsse alteração da dinâmica processual. Na proposição, o gestor seria nomeado não pelo magistrado, mas pelos Credores por meio de uma Assembleia Geral de Credores (AGC).

Na exposição de motivos, justificou-se essa escolha para aumentar a participação dos credores no processo falimentar, e de dar maior celeridade ao citado processo.

Feito esses breves apontamentos, é prudente destacar, inicialmente, que tanto o projeto, quando a exposição de motivos, não atribuem ao Administrador Judicial a culpa pela morosidade do processo.

Se essa culpa realmente existisse, ela seria apontada e justificada. Mas não houve esse apontamento. E pode-se também afirmar que tal culpa inexiste. Assim sendo, não caberia a “penitência” da substituição de tal agente por ser o processo falimentar moroso.

Dessa forma, qualquer nova função — ou mudança na dinâmica processual —, que implique alteração no sistema procedimental falimentar, é plenamente atribuível à competência do Administrador Judicial, na sua função de longa manus do magistrado.

Inobstante isso, tomando a justificativa apresentada na exposição de motivos, de que a alteração implicaria maior participação dos credores, é possível afirmar que ela não se sustentaria, salvo melhor juízo, por violação direta da imparcialidade.

E isso, porque, como dito, a resolução dos conflitos objeto de um processo falimentar implicam o controle do Estado. No controle por meio de um processo jurisdicional, presidido por um juiz togado e imparcial. Obviamente que este, na administração do conflito, necessita de auxiliares.

Parcialidade

Sem aprofundar necessariamente no tema dos vieses e dos demais elementos que impactam na tomada de decisão, a imparcialidade é o vetor que embasa a tomada de decisão na resolução dos conflitos pelo magistrado, seja nas decisões de forma ou de mérito, seja na decisão que nomeia o agente que atuará como seu auxiliar. Pois, como dito, ele será a extensão das próprias “mãos” do magistrado.

Ou seja, para que seja assegurada a imparcialidade como valor, a nomeação do auxiliar deverá partir de um sujeito imparcial (juiz togado), na intenção de nomear outro agente imparcial. Não apenas o sujeito deve ser imparcial. Suas escolhas também. E não há possibilidade de imparcialidade, na escolha do agente, se ela for tomada por um sujeito parcial.

Do contrário, como previsto no PL 03/24, a parcialidade dos credores, ainda que em sua maioria apurada por meio de uma AGC, criaria um campo frutífero para a contaminação do locus denominado processo, por conflito de interesses, ferindo a imparcialidade que deve atravessar todo o processo como o falimentar.

Nem mesmo a justificativa de que, com a escolha pelos credores, estes teriam uma maior participação justificaria tal alteração, uma vez que o processo pertence ao Estado.

Ademais, a efetiva participação dos credores foi preocupação precípua do legislador desde a promulgação da lei 11.101/05, aos quais foi oportunizada atuação ativa nos processos de reestruturação e falencial, por meio de constituição de um comitê formado por três credores, contudo, figura pouco vista na prática. Isto é, o credor detém ampla participação no aspecto material (decide pela aprovação ou não do plano de reestruturação), assim como no aspecto processual, ao lhe ser permitido acompanhar todas as fases e atos por meio do Comitê de Credores.

Ou seja, o processo de falência não deve atender apenas aos interesses dos credores, mas sim aos interesses do próprio processo revestido de cunho social (artigo 47, LFR), que é a resolução do conflito coletivo por meio da observância de regras pré-estabelecidas que refletem o modelo constitucional de processo.

E a imparcialidade que embasa o sistema condiciona não apenas a existência de um juiz togado,mas a escolha por um sujeito imparcial, para que possa agir como o seu longa manus.

Entender o contrário, além de ferir diretamente a imparcialidade, será permitir até mesmo aquela antiga hipótese de satisfação de um credor — célere, ou que tenha sido mais proativo —, em detrimento dos demais, pois será o maior credor quem determinará a escolha do agente — agente este que estará, ainda que indiretamente, ligado a esse credor, na possível busca de seus interesses individuais em detrimento dos demais.

Aline Barini Néspoli é advogada e administradora judicial.

Breno Pinto de Miranda é advogado e administrador judicial.

Luiz Alexandre Cristaldo é economista e administrador judicial.

Rodrigo D’Orio é advogado e administrador judicial.

Fonte: Folhamax

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Quem matou o Pantanal? por LUIZ HENRIQUE LIMA

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Resposta talvez encontre paralelo numa das obras mais conhecidas de Agatha Christie

Essa é uma pergunta que será feita pelos nossos netos e bisnetos ao assistirem documentários sobre o que foi um dos mais belos biomas do planeta, rico em biodiversidade e absolutamente encantador para os que amam a natureza, a flora, os animais.

 

Quem matou? Por que o fizeram? Como permitiram?

 

Imagino a incredulidade, a revolta, a decepção e a tristeza das gerações vindouras, privadas de conhecer, visitar e viver nesse que foi um dos maiores patrimônios naturais que o homem destruiu.

 

A resposta à pergunta talvez encontre paralelo numa das obras mais conhecidas da escritora inglesa Agatha Christie, talvez a mais lida de todos os autores de romances policiais. Trata-se de O Assassinato no Expresso do Oriente, livro de 1934 que mereceu várias adaptações para o cinema e que é considerado um verdadeiro clássico pela engenhosidade e sutileza da trama. Sem querer estragar a surpresa para um futuro leitor, uma das soluções apresentadas pelo detetive Hercule Poirot foi a de que todos os personagens eram suspeitos e todos os suspeitos eram culpados.

 

É muito tentador encontrar um único culpado para a morte do Pantanal. Alguém com fisionomia de vilão e mente de psicopata como o ecocida que despejou de avião toneladas de veneno sobre milhares de hectares. É relativamente simples atribuir o agonizar do ecossistema a uma causa genérica, imperceptível e inimputável como “mudanças climáticas globais”.

 

No entanto, tais respostas, embora parcialmente corretas, são apenas uma fração da verdade. Há uma pluralidade de razões e uma coletividade de culpados, por ações e omissões.

É muito tentador encontrar um único culpado para a morte do Pantanal

 

Retornando à literatura, recordei-me de Hemingway que, na sua obra sobre a guerra civil espanhola, sentenciou: “Não perguntes por quem dobram os sinos; eles dobram por ti”.

 

Não pergunte quem matou o Pantanal. Quem matou o Pantanal fomos nós.

 

Fomos nós os que ateamos fogos para acelerar o desmate. Fomos nós os que substituímos as pastagens naturais. Fomos nós os que não investimos em saneamento nas cidades das bacias hidrográficas que alimentam o Pantanal. Fomos nós os que “flexibilizamos” a legislação ambiental e licenciamos garimpos e usinas hidrelétricas no entorno e no interior do bioma. Fomos nós os fascinados pelo discurso do crescimento econômico a qualquer custo. Fomos nós os que nos omitimos diante do desmonte dos órgãos ambientais e das unidades de conservação que só existem no papel. Fomos nós os que ignoramos os alertas de cientistas e ambientalistas.

 

Fomos nós os que adiamos providências e medidas preventivas. Fomos nós os que discursamos em favor da transição energética e continuamos subsidiando termelétricas a carvão e planejando megainvestimentos em jazidas de combustível fóssil. Fomos nós os cidadãos que elegemos bancadas do boi, mas somos incapazes de eleger bancadas do bio.

 

Somos nós os que devemos pedir perdão ao Pantanal e aos nossos netos e bisnetos.

  

Luiz Henrique Lima é conselheiro certificado e professor

Fonte: Rufando o Bombo

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Mais respeito ao SUS e à vida! Por Natasha Slhessarenko

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O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo, oferecendo assistência integral, universal e gratuita a toda a população no Brasil. Sua criação, consolidada pela Constituição Federal de 1988, representa um marco na garantia do direito à saúde para todos os cidadãos.

Vamos destacar aqui a importância do SUS em seus vários aspectos, a começar pela garantia do acesso universal à saúde. Todos os cidadãos que o procuram, têm direito ao atendimento, independente de classe social, renda ou local de residência. A saúde é um direito fundamental de todos os cidadãos, esse é o princípio da universalidade.

Ao oferecer uma ampla gama de serviços, que vão desde a atenção básica até procedimentos de alta complexidade, envolvendo consultas, exames, cirurgias, vacinação, transplantes e fornecimento de medicamentos, lança luz sobre outro princípio, o da integralidade.



A atenção integral à saúde deve priorizar as ações preventivas, sem prejuízo das atividades assistenciais.




No âmbito da promoção e prevenção à saúde, o fortalecimento de toda a rede de atenção primária, com as equipes dos Programas de Saúde da Família, em alinhamento com os Agentes de Saúde e de Combate a Endemias, que levam saúde às comunidades, por meio das visitas domiciliares e acompanhamento contínuo das famílias, reforçam a magnitude e a importância deste princípio e o foco em prevenção e promoção da saúde.

Reforçando a jornada da promoção e prevenção à saúde, está o Programa Nacional de Imunização (PNI), um dos maiores programas de vacinação do mundo. Formulado  em 1973, ou seja, com mais de 50 anos, o PNI oferece 48 imunobiológicos, sendo 31 vacinas para toda população. São mais de 35 mil salas de vacinas espalhadas por este país de dimensões continentais, o que garante a aplicação de milhões de doses em um único dia, sem estratégias adicionais. Nenhum país do mundo tem Programa de Imunização maior que o nosso.

Outro pilar do SUS é a equidade, para a redução de desigualdades, ao promover a distribuição equitativa de recursos e serviços de saúde, alcançando áreas rurais e regiões remotas do país. Oferecer mais, para quem mais precisa. Além disso, desenvolve políticas e programas voltados para populações mais vulneráveis, como indígenas, quilombolas e moradores de rua.

Durante a pandemia de COVID-19, o SUS mostrou a sua força e o seu tamanho, ao desempenhar importante papel na testagem, tratamento, acompanhamento dos pacientes e na vacinação da população.

O SUS também está preparado para responder a desastres naturais, fornecendo atendimento de emergência e suporte às vítimas.

O SUS também está presente quando o SAMU é acionado.

No campo da pesquisa e desenvolvimento, o SUS está ligado a importantes instituições de pesquisa, como a Fiocruz, que desenvolve estudos e vacinas, contribuindo para avanços na saúde pública. Aqui destacamos a formação e capacitação de profissionais de saúde, garantindo um quadro qualificado para atender às necessidades da população.

Ao centralizar a aquisição de medicamentos e equipamentos, estabelecer novos modelos de compra e propor compartilhamento de risco, o SUS consegue negociar melhores preços e condições, bem como oferecer mais para a sociedade, promovendo a sustentabilidade financeira do sistema.

Ao garantir acesso à saúde, o SUS contribui para a melhoria da qualidade de vida da população, reduzindo morbidade e mortalidade, facilitando a inclusão social, reduzindo as desigualdades ao proporcionar condições de saúde adequadas para que todos possam participar ativamente da vida econômica e social do país.

 


Natasha Slhessarenko é pediatra e patologista.

Fonte: Rufando o Bombo

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A reeleição é prejudicial ao próprio mandato! Por Wilson Carlos Fuáh

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Com o advento da reeleição, o político tão logo começa o seu mandato, já está pensando nas próximas eleições, e esquecem-se dos compromissos para qual foi eleito, deixa de ser ele mesmo, pratica todo tipo de traição, trocando de partido em busca de espaços, pratica conchavos e acertos, e vira um mentiroso por excelência, tornando um político de qualidade duvidosa e tornando um “lobista” dos  grupos econômicos.

Vende-se o mandato, a espera de financiamento para a próxima eleição e com a “Cara de Pau” vira um líder sem ideologia e sem autonomia para decisão pessoal, e passa a fazer composição de bancadas fatiadas aos seguimentos diversos, agrupando por interesses escusos  e “comem nas mãos” dos poderosos e endinheirados, garantindo assim, o financiamento de campanha com dinheiro não declarado, mais conhecido como Caixa 2, (dinheiro em espécie), esquecendo-se do povo que os elegeu.  

A origem do “Caixa 2”, nasce em função da reeleição, porque no poder, o político é procurado pelos Grupos Econômicos, para buscar facilidade nas decisões das instituições públicas, (no executivo e no legislativo),  promovendo projetos de leis direcionados para beneficiar as ações que possam  beneficiar os seus financiadores futuro, tais como:  incentivos e isenções fiscais, fraudes em licitações e contratos, subornos de servidores públicos.  E, ao fim, com esses financiamentos ilegais, desequilibram os pequenos candidatos na eleição, ou seja, o resultado das eleições são transformado em  fraudes, pois os  eleitores sem consciência, são comprados pelos recursos financeiros sujos e lastreados na corrupção em todos os níveis de poder.

O  “Caixa 2”, é filho  da reeleição, porque a necessidade de se reeleger é que levam os políticos, a se venderem, a serem usados em troca de financiamento do “Por Fora”, dinheiro sujo em espécie, e por não haver registro contábil nas contas do candidato, não passam pelas  Contas Bancárias,  e por isso, não são declarados, e por não serem declarados, não estão nas Prestações de Contas, mas quando os políticos são pegos ou denunciados pelos “delatores premiados”, vem a público dizer cinicamente que:  “a minha Prestação de Contas foram devidamente aprovadas na forma da lei e pela Justiça Eleitoral, portanto, vou ajuizar uma ação,  para reparação de dano moral contra a minha pessoa, pois esses delatores premiados,  não tem prova do que estão dizendo, são ilações e fantasias”.              

Vejam que todos falam as mesmas coisas: “nunca coloquei as minhas mãos em dinheiro sujo, sou honesto e honrado, e não vou admitir que ninguém venha a manchar minha história política”.  

Sem a reeleição, em cada eleição se promoverá uma nova mudança do quadro político, e com isso o país estará expurgando e extirpando os políticos viciados e dando oportunidade aos novos lideres, e passando o país a limpo.

As próximas eleições  serão  muito diferente, porque poucos que irão votar, com certeza quem se dispor a votar, irá fazer com raiva, com nojo da situação atual e estarão promovendo “um limpa ao não votar em quem tem mandato continuado”, porque só o eleitor tem o poder de escolher os políticos,  e não depende de Lei,  basta não votar naqueles que estão pedindo mais oportunidade de continuar roubando os cofres públicos. 

As eleições futuras virão carregadas de sentimentos de mudanças e que dará a grande oportunidade para que o povo possa expulsar os maus políticos da vida pública: é só escolher bem, digitar o certo, e confirmar.

Wilson Carlos Fuáh – É Especialista em Recursos Humanos e pesquisador das Relações Sociais e Políticas, Graduado em Ciências Econômicas

Fonte: Rufando o Bombo

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As mais quente